Comunidades ainda valorizam o chamado dos sinos

A sineira Efigênia, de Congonhas-MG, é uma prova de que a tradição do toque de sinos vai além da questão de gêneroEm todas as cidades pesquisadas, os entrevistados mencionaram o fato de que, hoje em dia, não há mais a necessidade de se comunicarem os eventos por meio dos sinos. Vários toques praticados no passado caíram em desuso por causa disso. Em muitas igrejas, são usados alto-falantes para comunicar com mais detalhe notícias corriqueiras à comunidade. Acontece muito de a população telefonar para as paróquias, para as igrejas ou responsáveis para saber por que o sino tocou. Claro que ainda está implicada aí a sua função comunicativa, mas já não é necessário decodificar minúcias nos toques.

Apenas uma parte da população em cada uma dessas cidades reconhece as mensagens transmitidas pelos toques de sinos. Dessa parte, somente uma pequena parcela é capaz de decifrar matizes nas mensagens. As ocasiões em que mais se tocam sinos são justamente as festas de santos - eventos que concedem espaço largo à alegria, ao prazer, ao lúdico -, quando a função comunicativa dos toques é menos relevante. Parte da população aprecia simplesmente a beleza dos sons dos sinos, misturados aos foguetes e ao som das bandas.

É comum ouvir que os sinos são a voz de Deus ou que tocam para ele. Dentre os mais jovens, no entanto, a dimensão lúdica parece prevalecer sobre a religiosa. Seria interessante examinar se os sinos de fato “chamam” os jovens às igrejas; parece certo que os padres e os irmãos que cuidam das igrejas se valem do interesse dos mais jovens pelos sinos para despertá-los para a fé. Em São João del Rei, os sineiros mais velhos afirmam que os aprendizes dos sinos aos poucos vão se aproximando das funções litúrgicas e acabam por se filiar a uma ou mais irmandades. Mas talvez muitos desses novos sineiros continuem interessados apenas pelos sinos.

Os toques dos sinos são ainda valorizados nas comunidades como meio de comunicação que serve à comunhão em torno de acontecimentos importantes para a coletividade, carregam ainda um sentido místico que alimenta os devotos, mas, gradativamente, também migram para outros espaços, em que se vislumbra talvez condições mais favoráveis para sua continuidade em tempos atuais e futuros. Para uns os toques de sinos são agentes de congregação dos moradores em torno de acontecimentos importantes de seu cotidiano; para outros, elementos essenciais das celebrações religiosas, para outros ainda, brincadeira ou música. Para grande parte dos moradores dessas comunidades eles são referências fortes da paisagem e da história desses lugares.

O toque dos sinos, da forma como ocorre nessas cidades, é representativo de inúmeras peculiaridades, ele é capaz de promover nosso reconhecimento como uma comunidade imaginada, como brasileiros. Destacam-se, nesse processo de singularidades e universalidades, a questão da devoção religiosa e os inúmeros processos de migração e interiorização com suas respectivas aberturas de fronteiras e conquistas de territórios empreendidas por aqueles homens e mulheres que caminhavam em busca de melhores e novas oportunidades.

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