Dicionário do Patrimônio Cultural

Cadastro Nacional de Museus

Verbete

Rose Moreira de Miranda e Alejandra Saladino

O Cadastro Nacional de Museus (CNM) foi desenvolvido com o objetivo de produzir “conhecimentos e informações sistematizadas sobre o setor museológico brasileiro em toda sua diversidade” (BRASIL, 2013, p. 2).

Sua origem remonta a 2003, ano de lançamento da Política Nacional de Museus (PNM). Nessa ocasião, observa-se na primeira edição da Política, menção direta ao Cadastro, listado como uma das ações que deveriam ser empreendidas para a gestão e configuração do campo.
Sabe-se que a utilização de informações estatísticas qualificadas é fundamental para o monitoramento e a avaliação de políticas públicas. Compreendendo essa necessidade, o Sistema Brasileiro de Museus, em conjunto com o Departamento de Museus e Centros Culturais, do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (DEMU/IPHAN), iniciou, em 2005, o estudo de uma metodologia própria para o CNM.

Foram analisadas diversas iniciativas nacionais e internacionais de coleta sistemática de dados museais. No Brasil, destacaram-se os questionários produzidos pelo Conselho Federal de Museologia e da Vitae Apoio à Cultura, Educação e Promoção Social. Dentre as experiências internacionais, as análises focaram-se nos formulários do Ministério da Cultura da Espanha e da Direção Geral do Patrimônio Cultural da Catalunha.

Após os estudos, foi concebido um instrumento próprio para o CNM: um questionário de pesquisa, com 73 perguntas abertas e fechadas, distribuídas em oito blocos temáticos: I – DADOS INSTITUCIONAIS (subdividido em Identificação e Características Gerais da Instituição), II – ACERVO, III – ACESSO AO PÚBLICO, IV – CARACTERIZAÇÃO FÍSICA DO MUSEU, V – SEGURANÇA E CONTROLE PATRIMONIAL, VI – ATIVIDADES, VII – RECURSOS HUMANOS e VIII – ORÇAMENTO.

O modelo foi projetado com a premissa de respeito às diversidades tipológicas e regionais dos museus brasileiros. Ou seja, para além dos museus do tipo “tradicional”, o questionário deveria registrar as práticas dos museus comunitários, ecomuseus, museus de território e, de maneira inédita, dos museus virtuais.

Outra preocupação presente, ainda na fase inicial do projeto, foi o levantamento dos dados sobre museus presentes nas publicações impressas existentes em nosso país, que pudessem fornecer dados quantitativos ao trabalho. Verificou-se que a primeira publicação realizada, em nível nacional, foi de autoria de Heloísa Alberto Torres, editada em 1953 e que contava com 169 museus levantados no Brasil. O segundo guia, publicado em 1958, apontava 145 museus. Na década de 1970, dois guias destacaram-se: um, em 1972 indicava 402 museus e o outro, em 1978, 399 instituições. O guia com o maior número de museus registrados foi o lançado pela Associação Brasileira de Museologia, em 1984, que apontava 917 instituições museológicas. Em 1997, a Comissão de Patrimônio Cultural (CPC) da Universidade de São Paulo, através de um cadastramento, publicou a primeira edição do Guia de Museus Brasileiros, no qual se contabilizavam 756 instituições. Em 2000, a CPC lançou uma segunda edição do guia com menos registros: 531 museus.

A primeira apreciação pública do CNM ocorreu em maio de 2005, à época da apresentação da versão preliminar do questionário de cadastramento e do manual de preenchimento aos representantes das secretarias estaduais de cultura. Nessa oportunidade foram debatidas e sugeridas alterações importantes no primeiro formato desse instrumento. Em seguida, foi realizado um teste-piloto com todos os museus do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. A partir das respostas, foi redigida a versão final do material de cadastramento. O objetivo era testar a facilidade de preenchimento e compreensão do questionário e de seu manual.

Nesse mesmo período foi assinado o convênio entre o Ministério da Cultura da Espanha (por intermédio da Organização dos Estados Ibero-Americanos - OEI) e o Ministério da Cultura do Brasil (por intermédio do IPHAN), para o patrocínio do Cadastro Nacional de Museus.

O lançamento nacional do CNM foi realizado em 17 de março de 2006, no Museu Lasar Segall, em São Paulo, na mesma cerimônia de lançamento do Ano Nacional dos Museus. Em seguida, a convite do Sistema Estadual de Museus do Rio Grande do Sul, foi realizado um lançamento local, oportunidade para apresentação da metodologia a vários profissionais de museus da capital e de outros municípios do estado.

A implantação do CNM ocorreu em maio de 2006, a partir da distribuição do material impresso e digital, a todos os 1.241 museus que constavam na época, da mala direta do DEMU/IPHAN e, ainda, a organismos públicos e privados ligados ao patrimônio e a cultura. O material era composto por um cartaz, um folder explicativo, o questionário de cadastramento e o seu manual de preenchimento.

Além dessa estratégia, foi também aplicado um segundo método de coleta de dados: o trabalho local de cadastramento dos museus por assistentes especialmente capacitados. A ação foi promovida em parceria com as secretarias estaduais de cultura e os sistemas estaduais de museus, e visava disponibilizar auxílio às instituições museológicas no preenchimento do questionário e, ainda, proceder ao levantamento local de instituições museológicas através do contato direto com as prefeituras e secretarias municipais de cultura.

Ao total, foram investigadas 24 unidades federativas, listadas em ordem alfabética: Acre, Alagoas, Amapá, Amazonas, Bahia, Ceará, Distrito Federal, Espírito Santo, Goiás, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Paraná, Pernambuco, Piauí, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Roraima, Santa Catarina, São Paulo, Sergipe e Tocantins.

Um exemplo bastante significativo desse empreendimento foi o cadastramento do Museu Magüta, situado no município de Benjamin Constant, Amazonas, que foi criado pelos Tikuna como instrumento de preservação identitária e de diálogo com o preconceito sofrido pela população local. Atendendo à solicitação dos dirigentes do museu, o questionário de cadastramento foi preenchido em conjunto com a assistente do estado que, para chegar até o local, se deslocou de avião de Manaus até Tabatinga e depois, de catraia (espécie de ônibus fluvial), de Tabatinga ao município de Benjamin Constant. Este e outros exemplos da estratégia proativa empregada na coleta de dados possibilitaram o cadastramento de instituições nunca antes mencionadas por nenhum guia especializado e, em alguns casos, desconhecidas também pelos próprios equipamentos locais de cultura.

As informações prestadas pelos museus eram checadas por uma equipe técnica, anteriormente à inserção dos dados na base de dados. O objetivo era averiguar se todos os itens obrigatórios haviam sido respondidos e observar possíveis inconsistências, que, se identificadas, eram sanadas mediante contato telefônico ou por correspondência.

Um terceiro método de coleta de dados utilizado era o mapeamento de instituições museológicas. Para tal, a equipe técnica do CNM e os assistentes nos estados realizavam o levantamento sistemático de dados sobre museus em revistas especializadas e periódicos nacionais e locais, disponibilizados em meio impresso e digital.

A quarta e última ação de coleta de dados consistiu no estabelecimento de acordos técnicos com redes e sistemas locais de museus para trocas de informação, sobretudo com aqueles que já dispunham de iniciativas de cadastramento local do setor.

Em janeiro de 2009, foram promulgadas duas leis importantes para o campo museológico. Ambas mencionam o CNM. A primeira, denominada Estatuto dos Museus (Lei 11.904) especificou, em seu artigo 58, inciso VIII, que um dos objetivos específicos do Sistema Brasileiro de Museus é “contribuir para a implementação, manutenção e atualização de um Cadastro Nacional de Museus” (BRASIL, 2009b, p. 4). Já a Lei 11.906, conhecida como a de criação do Instituto Brasileiro de Museus (IBRAM), relacionou a gestão do Cadastro Nacional de Museus entre as competências da nova Autarquia.

Em 2011, duas publicações derivadas das informações do CNM foram lançadas: Guia dos Museus Brasileiros e Museus em Números, ambas integralmente disponíveis no site do IBRAM (www.museus.gov.br). A primeira obra apresentava informações básicas de localização, serviços e caraterísticas gerais aos usuários interessados no setor. Já a segunda publicação, registrou os dados de 3.025 museus que haviam sido mapeados pelo CNM até a data de corte da pesquisa: 10 de setembro de 2010. Desse universo, foram tratadas estatisticamente as informações de 1.500 museus que responderam ao questionário de cadastramento. (BRASIL, 2011b, p. XXVI)

No ano de 2013, a equipe do CNM iniciou uma profunda revisão das estratégias metodológicas de coleta e divulgação dos dados do Cadastro, englobando inclusive o debate sobre a sua missão. Tal fato foi motivado pela instituição de um novo instrumento da PNM: o Registro de Museus. Sabia-se que o Registro apresentava um objetivo diferenciado do CNM – a formalização dos museus no país – mas vislumbrava-se que sua operação demandaria às instituições informações anteriormente solicitadas pelo CNM.

A reflexão foi ampliada a todos os órgãos diretamente relacionados ao funcionamento do Registro de Museus: Sistema Brasileiro de Museus e órgãos locais relacionados a políticas públicas setoriais do campo museológico. O resultado foi o estabelecimento de um arranjo público colaborativo de gestão do Cadastro Nacional de Museus e do Registro de Museus, denominado Rede Nacional de Identificação de Museus (RENIM), além de alterações na forma e periodicidade de coleta dos dados e sua difusão. O resultado pode ser consultado na plataforma eletrônica da RENIM: http://renim.museus.gov.br/renim/.

Fontes Consultadas:
ALMEIDA, Fernanda de Camargo. Guia dos Museus do Brasil: roteiros dos bens culturais brasileiros levantados em pesquisa nacional. Rio de Janeiro: Expressão e Cultura, 1972.
BRASIL. Decreto 8.124, de 17 de outubro de 2013. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Poder Executivo. Brasília/ DF: 18 out. 2013. Seção 1, p. 1-5.
______. Instituto Brasileiro de Museus. Guia dos Museus Brasileiros. Brasília: Instituto Brasileiro de Museus, 2011a.
______. Instituto Brasileiro de Museus. Museus em Números. Brasília: Instituto Brasileiro de Museus, 2011b.
______. Lei 11.906, de 20 de janeiro de 2009. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Poder Executivo. Brasília/ DF: 18 out. 2009a. Seção 1, p. 1-2.
______. Lei 11.904, de 14 de janeiro de 2009. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Poder Executivo. Brasília/ DF: 15 jan. 2009b. Seção 1, p. 1-4.
______. Ministério da Cultura, Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, Departamento de Museus e Centros Culturais. Cadastro Nacional de Museus. Rio de Janeiro, 2006.
______. Ministério da Cultura. Política Nacional de Museus. Brasília, 2003.
CARRAZZONI, Maria Elisa (Coord.). Guia de Museus do Brasil. 2. ed. Rio de Janeiro: Expressão e Cultura, 1978. (Série Guias Culturais brasileiros; v.1).
FERNANDES, Neusa; SANTOS, Fausto Henrique dos; MOURA, Fernando Menezes de. Catálogo dos Museus do Brasil. Rio de Janeiro: Associação Brasileira de Museologia, 1984.
HOLLANDA, Guy de. Recursos educativos dos Museus Brasileiros. Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais e da Organização Nacional do ICOM (The International Council of Museums), 1958.
TORRES, Heloisa Alberto. Museums of Brazil. Ministry or Foreign affairs, Cultural Division, Publication Office, 1953. 
UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO. Comissão do Patrimônio Cultural. Guia de museus brasileiros. São Paulo: Divisão de Artes Gráficas, CCS, USP, 1997.
______. Guia de museus brasileiros. São Paulo: Edusp, 2000.

Como citar: MIRANDA, Rose Moreira de; SALADINO, Alejandra. Cadastro Nacional de Museus. In: GRIECO, Bettina; TEIXEIRA, Luciano; THOMPSON, Analucia (Orgs.). Dicionário IPHAN de Patrimônio Cultural. 2. ed. rev. ampl. Rio de Janeiro, Brasília: IPHAN/DAF/Copedoc, 2016. (verbete). ISBN 978-85-7334-299-4

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Ficha Técnica

Rose Moreira de Miranda Mestre em Ciência da Informação (UFRJ/IBICT) e doutoranda em Museologia (Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias- Lisboa/Portugal). Professora substituta do Curso de Museologia da Universidade de Brasília (UnB) e servidora do Instituto Brasileiro de Museologia (IBRAM).
 

Alejandra Saladino Mestre em Arqueologia (PPGARQ/MN/UFRJ), mestre em Memória Social (PPGMS/UNIRIO), doutora em Ciências Sociais (PPCIS/UERJ), professora adjunta da Escola de Museologia (UNIRIO), do Programa de Pós-Graduação em Museologia e Patrimônio (PPG-PMUS) e do Mestrado Profissional em Preservação do Patrimônio Cultural (IPHAN).