Missão Francesa completa 200 anos
Um dos marcos do desenvolvimento das artes no Brasil, a Missão Artística Francesa que aportou nos trópicos em 25 de março de 1816, completa este ano seu bicentenário. O principal objetivo era dar início ao ensino regular das artes no Brasil, acompanhando o surgimento de diversas instituições públicas que se estabeleceram com a vinda de Dom João VI e da Família Real Portuguesa para a colônia em 1808, como, por exemplo, a Biblioteca Nacional.
Após a criação do Reino Unido a Portugal e Algarves, Dom João VI e seu ministro Antonio de Araujo Azevedo, conhecido como Conde da Barca, têm a preocupação de instituir a educação formal, que após a expulsão dos jesuítas, responsáveis pelo sistema educativo no Novo Mundo, ainda no primeiro período da colonização, tinha ficado negligenciada. Dessa maneira, articulam a vinda do grupo ao Brasil para empreender o projeto de institucionalização do ensino da arte.
De acordo com o embaixador Marcos Castrioto de Azambuja, membro do Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural do Iphan, àquela época em que “éramos sede de um Reino Unido a Portugal e Algarves. Com os portos se abriram também – e irresistivelmente – os espíritos e as ambições da gente da terra [...] movidos pelo vento da mudança”.
Tais ventos que trouxeram os franceses estavam acompanhados pelo espírito das luzes, ou seja, pelas ideias iluministas que se libertavam dos dogmas da Igreja católica e os substituíam pelo pensamento filosófico e o saber acadêmico e científico. Foi neste contexto que a Missão se instituiu, chefiada por Joachim Le Breton e tendo como principais representantes os pintores Jean Baptiste Debret e Nicolas Antoine Taunay; os escultores Auguste Marie Taunay, Marc Ferrez e Zépherin Ferrez; e o arquiteto Grandjean de Montigny.
A presença desses artistas vai além de influências estéticas, está imersa num contexto histórico em que se pretendia modernizar a nova sede do reino. Ao se estabelecerem, criam as estruturas necessárias para efetivarem o projeto educativo e inauguram a Academia Imperial de Belas-Artes, em 1826.
A partir de então, o estilo que impera nas artes e na arquitetura é o neoclássico, seguindo uma tendência mundial, implantada, aqui, pela Missão, como estilo oficial da Corte portuguesa, embora de filiação eminentemente francesa. Esta vertente estilística recebeu, posteriormente, críticas negativas. Os modernistas que criaram o Iphan, por exemplo, e que estabeleceram fortes vínculos entre o passado colonial e a modernidade, eram defensores de que a inserção do neoclássico teria rompido o processo de construção de uma arte brasileira “genuína”. (Foto: Portal da antiga Academia Imperial de Belas Artes. Projeto de Grandjean de Montigny)
O museólogo e conservador do Museu Nacional de Belas Artes, Pedro Martins Caldas Xexéo, ressalta que “um argumento clássico contrário à influência dos artistas franceses e seus imediatos seguidores brasileiros é que o desenvolvimento natural da arte brasileira dentro dos princípios formais do Barroco foi interrompido abruptamente por uma proposta formal alienígena que impedia a continuidade da trajetória natural de nossa arte”. Os estilos Barroco e Rococó se encontravam esgotados segundo Xexéo e sem representantes de vulto naquele momento. Além do que o neoclássico teria se estabelecido de qualquer sorte, dado a vinda da Corte, de sua difusão por toda Europa Ocidental e por representar uma nova ideia de sofisticação pela elite.
A Missão Francesa representou, portanto, a profissionalização artística, formando uma geração de pintores e arquitetos. Além disso, deixou um acervo que registrou tipos humanos e cenas do cotidiano do Brasil colônia. Sem as gravuras de Debret, por exemplo,seria escasso o conhecimento sobre as primeiras décadas do século XIX, no Brasil, em seus aspectos, sociais, etnográficos e das paisagens urbanas e rurais. Ao retratar hábitos, vestuários, danças, costumes, celebrações, ele torna-se um artista a serviço do registro histórico. Segundo o escritor Antônio Carlos Villaça, autor do ensaio “Debret, um itinerário de amor”, em sua obra há um “cheiro de povo”.
Principais artistas
Joachim Le Breton (1760-1819)
Conhecido como o chefe da Missão Artística Francesa, foi secretário perpétuo da Classe de Belas-Artes do Instituto da França e um intelectual muito respeitado, que trouxe além de seus conhecimentos um acervo de obras ainda não visto no Brasil. Foi o primeiro a se empenhar na missão de institucionalizar o ensino das artes no país. Morreu na cidade do Rio de Janeiro.
Jean Baptiste Debret (1768-1848)
Pintor e desenhista, Debret foi um dos principais personagens da Missão, deixando um amplo registro sobre os costumes e a paisagem brasileira. Frequentou a Academia de Belas Artes na França, na qual foi aluno do pintor Jacques-Louis David, o principal nome do neoclassicismo francês. Atuou como professor de pintura histórica na Academia Imperial de Belas Artes no Brasil, entre 1826 e 1831. No ano de 1829 promove a Exposição da Classe de Pintura Histórica da Imperial Academia das Belas Artes, que se tornou a primeira mostra pública em território nacional. Retorna à França, em 1831, e edita o livro Viagem Pitoresca e Histórica ao Brasil, em três volumes.
Nicolas Antoine Taunay (1755-1830)
Foi, assim como Debret, um importante pintor e ilustrador. Registrou alguns momentos da campanha de Napoleão Bonaparte. Com o fim do império napoleônico, vem ao Brasil com a Missão Francesa em 1816. Atuou como professor de pintura de paisagem na Academia Imperial de Belas Artes. Por divergências com a administração da Academia retornou à França em 1821.
Auguste Henry Victor Grandjean de Montigny (1776-1850)
Arquiteto e urbanista, formou-se pela École d'Architetucture [Escola de Arquitetura] de Paris. Foi um profissional influente no império napoleônico. Com a derrocada de Napoleão, Grandjean de Montigny aceita o convite para integrar o grupo de franceses que viriam ao Brasil. Atuou na Academia Imperial como professor de arquitetura. Permaneceu no país até sua morte e deixou como obras, na cidade do Rio de Janeiro, o edifício da Praça do Comércio, atual Casa França Brasil; o Solar Grandjean de Montigny, no bairro da Gávea; a Academia Imperial de Belas Artes, da qual só permaneceu o portal, hoje instalado no Jardim Botânico, na cidade do Rio de Janeiro.
Mais informações para a imprensa:
Assessoria de Comunicação Iphan
comunicacao@iphan.gov.br
Adélia Soares – adelia.soares@iphan.gov.br
Gabriela Sobral Feitosa – gabriela.feitosa@iphan.gov.br
(61) 2024-5463/ 2024-5461 / 2024-5459