Tombamento da Casa da Flor, em São Pedro da Aldeia (RJ), é aprovado por unanimidade
O Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural aprovou por unanimidade a inscrição da Casa da Flor no Livro do Tombo de Belas Artes, durante sua reunião na sede do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), em Brasília (DF), nesta quinta-feira, 15 de setembro. Novo Patrimônio Cultural Material Brasileiro, a construção fica em São Pedro da Aldeia, na Região dos Lagos (RJ), e foi criada por Gabriel Joaquim dos Santos, filho de uma índia e de um ex-escravo, com paredes em taipa e utilizando esteios em madeira roliça, decorada com mosaicos, esculturas e enfeites criados a partir do lixo e objetos quebrados.
Para a presidente do Iphan, Kátia Bogéa, "tombamento deste bem é mais um marco na evolução do conceito de Patrimônio Cultural. Até então, nada parecido com a Casa da Flor foi tombado no país". Um outro exemplo da diversidade e deste processo de ampliação do que é Patrimônio Cultural no Brasil foi o tombamento da Casa de Chico Mendes, em Xapuri (AC), no ano de 2011. Ambas foram reconhecidas por sua singularidade, por sua unicidade. No entanto, a Casa de Chico Mendes foi inscrita no Livro do Tombo Histórico e a Casa da Flor, no Livro do Tombo de Belas Artes.
Em seu parecer, o relator e conselheiro Leonardo Castriota, comparou a Casa da Flor a outras obras internacionais também reconhecidas como patrimônio cultural em seus países, como a Watts Towers, em Los Angeles (Estados Unidos) – criadas por Sabato Rodia (1879-1965), um imigrante italiano trabalhador da construção civil – e o Palais Idéal du Facteur Cheval, em Hauterives (França) – construído por Ferdinand Cheval (1836-1924), um carteiro francês.
Tudo caquinho transformado em beleza
Em 1912, Gabriel Joaquim dos Santos (1892-1985), um trabalhador nas salinas, em São Pedro D’Aldeia, na Região dos Lagos (RJ), filho de uma índia e de um ex-escravo, abusando de sua criatividade decidiu construir sua própria casa. Singela, com paredes em taipa e utilizando esteios em madeira roliça, o que chama a atenção é aquilo que o próprio Sr. Gabriel diz ser uma “casa feita de caco transformado em flor”.
Quando a construção de sua casa já estava em andamento, Sr. Gabriel conta que, em 1923, inspirado por um sonho, começou a embelezar a casa com mosaicos, esculturas e enfeites diversos coletados no lixo e a partir de objetos quebrados. Segundo ele, eram “coisinhas de nada”; eram búzios, conchas e outros depósitos da lagoa, detritos industriais, pedaços de azulejos e faróis de automóveis que transformaram a construção. Foi assim que nasceu a Casa da Flor.
Quem chega à casa passa, primeiramente, por uma pequena escadaria guarnecida de pedras e ladeada de flores confeccionadas por cacos de louças e telhas. Nenhum arranjo é igual ao outro. Um corredor externo delimitado por um muro igualmente feito de coisas quebradas determina um primeiro espaço de convivência, ao ar livre, onde há um banco com motivos abstratos e figurativos, como flores, folhas, cachos de uva, carrancas. Internamente, a casa em formato de T, guarda outras surpresas, já que até mesmo o observador mais atento não consegue perceber todos os elementos que compõe os seus três ambientes.
Após a morte do seu proprietário, a casa foi recuperada com recursos públicos e hoje é mantida por meio de projetos culturais. A casa possui um tutor, o sobrinho do Sr. Gabriel, que cuida da conservação da propriedade e da recepção aos visitantes.
De acordo com o parecer do Iphan, entre as justificativas para o tombamento da Casa da Flor está o ineditismo criativo, que instiga ao debate sobre os processos de produção cultural. O documento destaca que “a Casa da Flor condensa esse esforço de ordenar a desordem, a fragmentação e as oposições, de acordo com um conhecimento do valor das coisas e não da sua utilidade meramente funcional.”
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