Manaus - AM - PAC

O centro histórico de Manaus - tombado pelo Iphan em janeiro de 2012 - abrange uma área entre a orla do rio Negro e o entorno do Teatro Amazonas e ainda mantém os aspectos simbólicos e densos de realizações artístico-construtivas. Apresenta uma fração urbana formada por edificações do período áureo da borracha, mesclada a edifícios modernos e representa um dos maiores testemunhos de uma fase econômica ímpar no Brasil, quando a exploração do látex proporcionou o incremento da industrialização em escala mundial.

A preservação deste núcleo, que configura o coração urbano da cidade, garante a manutenção de seu patrimônio singular e integro, e inclui Manaus no rol das cidades históricas do Brasil, com inscrição no Livro de Tombo Histórico e no Livro de Tombo Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico. Mesmo fragmentada, Manaus ainda possui um vocabulário arquitetônico vasto e diversificado, com representação de todas as correntes ecléticas e a verticalização ainda não compromete a percepção do espaço criado na Belle Époque*. A cidade pode ser vista como um espaço urbano composto por monumentos, arquitetura corrente e áreas livres públicas, formando um conjunto que celebra e representa o ecletismo no norte do país.

Entre os anos de 1580 e 1640, época em que Portugal e Espanha estavam sob uma só coroa, tem início a povoação europeia na Amazônia. Fundada em 1669, a partir do Forte de São José da Barra do Rio Negro – mais tarde o povoado que originou a cidade sede da Capitania e da Província -, foi estabelecida na margem esquerda do rio Negro. O forte havia sido construído para evitar a invasão dos holandeses aquartelados no Suriname (ex–Guiana Holandesa) e garantir o domínio da Coroa Portuguesa na região. 

O povoado, que se desenvolveu em torno da fortaleza, recebeu o nome de São José da Barra do Rio Negro. Em 1832, sob a denominação de Nossa Senhora da Conceição da Barra do Rio Negro, o lugarejo foi elevado à categoria de vila e, em 1848, a Vila da Barra foi novamente elevada, então à categoria de cidade, com o nome de Cidade da Barra do Rio Negro. A cidade recebeu, em 1856, finalmente, o nome de Manaus, em homenagem à nação indígena dos Manáos (Mãe dos Deuses), o mais importante grupo étnico habitante da região, reconhecido historicamente pela sua coragem e valentia.

Até 1885, Manaus ainda tinha o aspecto de uma vila, um pequeno povoado espraiado, seguindo a condição geográfica do local, cortado por igarapés, entretanto, desde 1850, com a elevação da Comarca do Alto Amazonas à Província do Amazonas, foi autorizada a navegação a vapor ao longo do rio Amazonas e seus afluentes. Esse fato criou as condições de transporte par a nova fase econômica que viria a seguir. Manaus é um dos maiores testemunhos de uma fase econômica ímpar - o período da borracha - no qual a exploração do látex proporcionou o surgimento de cidades que são testemunho da ocupação e do desenvolvimento daquela região no contexto do incremento da industrialização em escala mundial.

Com a proclamação da República, em 1889, Manaus é elevada a capital do Estado do Amazonas, época em que a borracha, matéria-prima da indústria mundial, era cada vez mais requisitada. O Amazonas, como principal produtor, orientou sua economia para atender à demanda, no chamado Período Áureo da Borracha (1890-1910). Para a história do Brasil, a borracha, como outros produtos, tem seu lugar no tempo. Por meio dela, o Norte do Brasil se tornou um eixo econômico, possibilitando ao país, embora temporariamente, uma supremacia econômica mundial.

A cidade passou a receber brasileiros de várias partes do país, além de ingleses, franceses, judeus, gregos, portugueses, italianos e espanhóis. Esse crescimento demográfico gerou mudanças significativas na cidade. Com a riqueza gerada pela exploração da borracha, os governantes e comerciantes locais trouxeram da Europa vários arquitetos e paisagistas para a execução de um ambicioso plano urbanístico, que resultaria em uma cidade com perfil arquitetônico europeu, embora dentro da selva.

Em 1890, a "Metrópole da Borracha" adquirira todos os hábitos e costumes das "cidades modernas". A partir de 1892, o governo de Eduardo Ribeiro elaborou um plano para coordenar o crescimento. Manaus ganhou o serviço de transporte coletivo de bondes elétricos, telefonia, eletricidade e água encanada, além de um porto flutuante, que passou a receber navios de diversas bandeiras. A exploração, o beneficiamento e a exportação da borracha são regulamentadas e Manaus torna-se a sede das grandes casas exportadoras. A cidade liga-se diretamente ao mercado internacional e contribui economicamente com 38% das divisas do país.
 
Essa situação resulta no edital, em 1899, para execução de obras de melhoramento do Porto de  Manaus, a fim de escoar a produção da borracha. O contrato foi fechado em 1900 entre o Governo Federal e a firma B. Rymkierwiez & Cia, entretanto é transferido para a firma inglesa Manaos Harbour Limited, e as obras começam em 1902. O porto foi construído respeitando o fenômeno de cheia e vazante do rio Negro. O ferro aparece com soluções formais próprias - armazéns com chapas onduladas de vedação, o road-way sobre boias flutuantes. Nos edifícios da Alfândega e da Administração a estrutura de ferro está oculta sob vedações de alvenaria, com elementos alusivos a estilos passados. Os armazéns foram construídos de 1903 a 1910.

No porto de Manaus, banhada pelo rio Negro, além do cais de alvenaria foi construído um cais sobre boias de ferro cilíndricas para flutuar independentemente do nível do rio. A forma de pensar a arquitetura do início do século XX está bem representada no porto. O ferro aparece com soluções formais próprias - armazéns com chapas onduladas de vedação, road-way sobre boias flutuantes. Nos edifícios da Alfândega e da Administração a estrutura de ferro se esconde sob vedações de alvenaria, com elementos alusivos a estilos passados.
 

Nabil BondukOs prédios da Alfândega e da Guardamoria representam uma transição entre o conjunto de armazéns (construídos de 1903 a 1910) e os edifícios da empresa Manaos Harbour Ltd., por utilizarem o sistema de pré-moldagem. Três das edificações tombadas são anteriores aos empreendimentos da Manaos Harbour: o antigo edifício do Tesouro Público (inscrições na fachada 1887-1890) de estilo neoclássico, o Trapiche 15 de Novembro, e a bomba de incêndio junto a este trapiche (obras públicas de 1869 a 1881).

A metrópole da borracha, nos anos 1900, abrigava uma população de 20 mil habitantes, em suas ruas retas e longas, calçadas com granito e pedras de lioz importadas de Portugal, praças e jardins exuberantes, fontes, monumentos e o suntuoso Teatro Amazonas. Além de hotéis, cassinos, estabelecimentos bancários, palacetes e todos os requintes de uma cidade moderna.

Atualmente, os imóveis históricos, em sua maior parte, estão entre a Avenida Eduardo Ribeiro e a Rua Leonardo Malcher. Do núcleo colonial, resta apenas o traçado urbano, orgânico em contraponto ao traçado planejado, ainda no século XIX. Na arquitetura, uma boa quantidade de edifícios ecléticos ainda está preservada. O núcleo histórico de Manaus no século XXI apresenta uma porção urbana formada por edificações do período áureo mesclada a edifícios modernos.

Entre as edificações tombadas estão o Escritório Central e fachada anexa (Rua Taqueirinha, Nº 125), Setor Administrativo (Rua Governador Vitório, Nº 121), Setor de Operações - antigo prédio do Tesouro (Rua Monteiro de Souza S/N), Museu do Porto (Rua Vivaldo Lima, Nº 610), imóvel da Rua Bernardo Ramos n° 69 e n° 77, antiga Casa da Tração Elétrica (Rua Marquês de Santa Cruz, S/N), Road-Way e a bomba de incêndio, e Armazéns Nº 3, 4, 5, 10, 15, 18 e 20. Espaços públicos tombados estão o Paço da Liberdade (Museu da Cidade), Coreto e Chafariz da Praça Dom Pedro II e Praça IX de Novembro.
 

José Paulo LacerdaMercado Adolpho Lisboa - O Mercado Municipal Adolpho Lisboa, um dos mais importantes centros de comercialização de produtos regionais em Manaus, foi construído no período áureo da borracha. Por ser um dos principais exemplares da arquitetura de ferro sem similar em todo mundo, foi tombado em 1º de julho de 1987 pelo Iphan. Sobre a bandeira do portão principal, existe uma cartela cravada com o nome Adolpho Lisboa que, na época da construção, era prefeito da cidade de Manaus. Posteriormente Lisboa deu o nome ao mercado.

Teatro Amazonas - Inaugurado em 1896, é a expressão mais significativa da riqueza da região durante o Ciclo da Borracha. A cidade era uma das mais prósperas do mundo, embalada pela riqueza advinda do látex da seringueira, produto altamente valorizado pelas indústrias europeias e americanas. Por isto, necessitava de um lugar onde pudessem se apresentar as companhias de espetáculos estrangeiras e a construção do teatro, assim, era uma exigência da época. O projeto arquitetônico escolhido foi o de autoria do Gabinete Português de Engenharia e Arquitetura de Lisboa e hoje é o principal patrimônio cultural arquitetônico do Amazonas, tombado como patrimônio histórico pelo Iphan em 28 de novembro de 1966.

Caixa d’água - Reservatório de Mocó - Magnífica obra em estilo neorrenascentista, foi inaugurada em 1899 durante o período áureo da borracha. O reservatório que abrange uma área com cerca de mil metros quadrados foi planejado e construído com o objetivo de solucionar os problemas de abastecimento de água, que atingiam a cidade no final do século XIX. Destaca-se pela imponência de sua estrutura interna – toda em ferro importado da Inglaterra – que suporta dois enormes tanques metálicos, instalados no espaço superior da edificação. Tombado pelo Iphan em 13 de Março de 1995, o Reservatório do Mocó abastece ainda hoje parte da Cidade de Manaus.

Praça Dom Pedro II - Inaugurada em 1897, era inicialmente cercada de gradis, removidos em 1907 e instalados na entrada sul do Mercado Adolpho Lisboa, onde permanecem até os dias atuais. Possui um coreto em ferro, concluído em 1888, feito pela empresa inglesa Francis Morton & Cia. Limited Engineer, de Liverpool, e um chafariz também de ferro. A Praça foi construída sobre um cemitério indígena, descoberto no final do século XIX, e registrado como sítio arqueológico na década de 60 do século XX.

Relógio Municipal - Construído em 1929, sendo autor do projeto o amazonense Coriolano Durand, possui estilo neoclássico e engrenagem de origem suíça. Nele há dois mostradores. Em um deles há a inscrição latina Vulnerant omnes, ultima necat, que significa Todas ferem, a última mata.

Academia Amazonense de Letras - Fundada em 1918, funcionou, inicialmente, no Instituto Universitário de Manaus. A doação do atual prédio ocorreu em 1935, sendo este pertencente ao repertório eclético.
 

José Paulo Lacerda     José Paulo Lacerda     Nabil Bonduk
 

Instituto Benjamin Constant - Construção do final do século XIX, em estilo eclético, recebeu vários usos: palacete do Barão de São Leonardo, museu botânico, orfanato Instituto Benjamin Constant. Atualmente é unidade do Centro de Educação Tecnológica do Amazonas.

Biblioteca Pública do Estado - Construída entre 1905 a 1910, em terreno onde funcionava o Estábulo Público, sofreu um incêndio em 1945, perdendo quase todo o seu acervo e a ala sul do prédio, que foi reconstruída e reaberta dois anos mais tarde. Foi projetada pelo arquiteto paraense José Castro de Figueiredo. Em sua arquitetura de estilo eclético, com predominância de elementos clássicos, destaca-se a escadaria interna, de ferro forjado em rendilhado, procedente de Liverpool, Inglaterra.

Cemitério São João Batista - A aquisição dos primeiros terrenos iniciou-se em 1890, e foi inaugurado em 1891. Em 1905 foram construídos os muros voltados para a Avenida Álvaro Botelho Mais e Rua Major Gabriel, incluindo seus portões de ferro, de origem escocesa. Os outros muros datam do início da década de 20 do século passado. Possui capela em estilo neogótico, inaugurada em 1906 e reformada em 1915. Está localizado na área de entorno do Reservatório do Mocó.

Centro de Artes Chaminé - No prédio funcionou a antiga estação de tratamento de esgotos, sob responsabilidade da empresa inglesa Manaos Improvements Limited Company. Sua construção foi concluída em 1910. Em 1993, tornou-se o Centro de Artes Chaminé.

Agência dos Correios e Telégrafos - Construído no início do século XX para abrigar a firma Marius & Levy, o prédio de estilo eclético, possui revestimento cerâmico e tijolos aparentes em todas as fachadas. A empresa de Correios e Telégrafos está no edifício desde 1921.

Grupo Escolar Euclides da Cunha (datado de 1896), Grupo Escolar Barão do Rio Branco (antigo Consulado de Portugal, em 1943 passou ser a sede da escola), e Grupo Escolar José Paranaguá(inaugurado em 1895, atualmente abriga o Conselho Estadual de Educação).

Faculdade de Direito - Nesse prédio funcionaram o Grupo Escolar Silvério Nery e o Grupo Escolar Nilo Peçanha.  A partir de 1934, instalou-se a Faculdade de Ciências Jurídicas e Sociais de Manaus, nome alterado para Faculdade de Direito do Amazonas em 1936, que foi transferido para o Campus Universitário, em 2004. Em estilo eclético, o segundo pavimento foi construído na reforma ocorrida entre 1936 e 1938.

*Belle Époque é o nome dado a uma época de mudanças culturais e artísticas registradas na história da França, entre o final do século XIX e o início da 1ª Guerra Mundial, em 1914.

 

Obras do PAC Cidades Históricas

Requalificação urbanística:
Praça XV de Novembro (jardins, entorno e restauração do Relógio Municipal (escadaria, trecho da Av. Eduardo Ribeiro, entre a av. 7 de Setembro e Alfândega)
Praça Adalberto Vale (acessibilidade, iluminação, sinalização e paisagismo)
Praça Terneiro Aranha (acessibilidade, iluminação, sinalização, mobiliário urbano e paisagismo)
Praça D. Pedro II - Chafariz e Coreto (drenagem, irrigação, pavimentação, sinalização, mobiliário urbano e paisagismo)
Entorno do Mercado Municipal Adolpho Lisboa (recuperação da pavimentação, acessibilidade, iluminação, sinalização, mobiliário urbano e paisagismo, nas ruas dos Barés, Barão de São Domingos, Miranda Leão, além da Av. Manaus Moderna e Praça do Mercado)

Restauração:
Pavilhão Universal (desmontagem e retirada da Praça Terreiro Aranha para implantação na Praça Adalberto Vale)
Casarão da Biblioteca Municipal
Antiga Câmara Municipal
Antigo Hotel Cassina (implantação do Centro de Arte Popular)
Antigo edifício do Corpo de Bombeiros (implantação da Pinacoteca Municipal)

Fontes: Arquivo Noronha Santos/Iphan e IBGE

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