Homenagem ao Mestre João Pequeno

publicada em 13 de dezembro de 2011, às 13h39

 

Boa viagem, mestre - “O mundo de Deus é grande, traz numa mão fechada, O pouco com Deus é muito, O muito sem Deus é nada” – canto na roda"

João Pereira dos Santos, Mestre João Pequeno, 93 anos, fez a despedida dessa terra no dia 9 de dezembro. Foi de encontro a Pastinha que o deixou como guardião das mandingas e de quem recebeu a missão “você toma conta disto, porque vou morrer só no corpo, e em espírito eu vivo, enquanto houver Capoeira o meu nome não desaparecerá”. Também João continuará vivo pela arte de seus capoeiristas. 

Nasceu em 27 de dezembro de 1917, em Araci – BA (210 km de Salvador), filho de Maria Clemença de Jesus, ceramista e descendente de índio e de Maximiliano Pereira dos Santos vaqueiro na Fazenda Vargem do Canto na Região de Queimadas. Adolescente, trabalhou na Mata de São João por dez anos plantando cana de açúcar. Aí encontra Juvêncio na Fazenda São Pedro e começa seu encontro de vida com a capoeira

Aos 25 anos está em Salvador e segue no jogo da sobrevivência como condutor de bondes e servente de pedreiro (chegou a mestre de obras). Virando massa na construção é levado por Cândido, companheiro de trabalho, para as rodas de Cobrinha Verde, no Chame-Chame, lideradas por Mestre Barbosa. Caminho aberto para o Centro Esportivo Capoeira de Angola de Mestre Pastinha de quem recebe o cargo de treinel e o nome que lhe faria grande no Brasil e no mundo.

Sua sabedoria vinha temperada nas dificuldades do cotidiano (chegou a ser chamado João do carvão quando residiu no Garcia pela poeira de ser carvoeiro). Sabia das artes da ginga para desmontar o adverso.  Praticava sempre o equilíbrio entre a precisão física do golpe e a preciosidade espiritual da capoeira como formadora profunda da pessoa: generosa, fraterna e sempre na sintonia do coletivo, do se é bom pra mim, vai ser melhor para todos. 

Em 2 de maio de 1982 ele reabre o Centro de Angola no Forte Santo Antônio Alem do Carmo (1982) e daí faz a base para ganhar o mundo. Receberam seus ensinamentos e,  principalmente sua lição de vida, outros grandes mestres baianos como João Grande, seu grande parceiro de jogo, Morais e Curió.

Próprio desse caminho dos Mestres autênticos no saber e no fazer da cultura popular, João mesmo pressionado pelas dificuldades financeiras desfilava sua dignidade em inúmeras homenagens tais como o título de cidadão honorário da cidade de Salvador, doutor Honoris Causa pela Universidade Federal de Uberlândia, a Comenda da Ordem do Mérito Cultural, a medalha Zumbi dos Palmares, em 2008 o título de doutor Honoris Causa pela Universidade Federal da Bahia (UFBA) e mais recentemente, outubro 2010  recebeu o Prêmio Viva Meu Mestre do Iphan – Ministério da Cultura como reconhecimento maior do Patrimonio Cultural Imaterial do Brasil.

Quando completou 93 anos, João disse: “Um lado da minha vida faz parte de Deus, que é a vida eterna, e a Capoeira é como outra parte de mim”. Essa eternidade estará sempre presente na prática dos seus ensinamentos. Todo ano na data do aniversário dele, 27 de dezembro, uma grande roda acontece como celebração espontânea que virou tradição no universo da capoeira. João Pequeno, este ano, vai participar lá de cima com Pastinha e a emoção será maior para mostrar que essas vidas semearam tanto e deixaram muita força para os que resistem não deixarem a luta, nunca.

 

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