Ponte Mauá, em Jaguarão-RS, é o primeiro bem binacional tombado pelo Iphan

publicado em 04 de maio de 2011, às 15h44

 

Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural aprovou o tombamento da ponte e do conjunto histórico e paisagístico da cidade na fronteira com o Uruguai

Símbolo de uma união afetiva entre as cidades de Jaguarão, no Rio Grande do Sul, e Rio Branco, no Uruguai, a Ponte Internacional Mauá está inscrita nos Livros do Tombo Histórico, Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico, das Artes Aplicadas, e destaca a construção do início do Século XX como o primeiro bem binacional tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). A decisão inédita no Brasil, tomada durante a reunião do Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural, realizada na última terça-feira, dia 3 de maio, em Brasília. Os conselheiros aprovaram também o tombamento do conjunto histórico e paisagístico de Jaguarão como patrimônio cultural do país, uma área urbana que guarda um acervo considerável de bens culturais, com edificações coloniais, ecléticas, art déco e modernistas.

Extremamente bem preservado e íntegro, o conjunto histórico de Jaguarão apresenta variação da tipologia, formas de implantação e acabamentos. O traçado viário da cidade, demasiadamente retilíneo se comparado ao das cidades coloniais brasileiras, decorre possivelmente da forte influência espanhola em seu desenvolvimento. Desde 2009, Jaguarão recebe investimentos do PAC Cidades Históricas, programa interministerial e federativo elaborado para articular ações de preservação do patrimônio cultural em 173 municípios brasileiros. Cerca de R$ 1,3 milhão já foram destinados para obras na cidade gaúcha, com destaque para a restauração do Teatro Esperança.

Jaguarão, uma história de disputas territoriais e economia pecuarista
A formação do Conjunto Histórico e Paisagístico de Jaguarão, agora tombado como Patrimônio Histórico Nacional, está intrinsecamente ligada aos processos de expansão das ocupações portuguesa e espanhola no território americano e às respectivas estratégias para garantir a posse de seus territórios.

Durante o período conhecido como União Ibérica (1580-1640), estiveram suspensas as disputas territoriais. Nesse período foram descobertas as primeiras minas de prata na região andina e os primeiros caminhos de acesso a elas, a partir da navegação pelos rios afluentes do Rio da Prata. Mas com a restauração do reino de Portugal, a coroa lusitana partiu para a ocupação das terras ao sul do seu último ponto estabelecido pelo Tratado de Tordesilhas – a Capitania de São Vicente – com a fundação de portos e povoações nas baías de Paranaguá e da Babitonga, na Ilha de Santa Catarina, em Laguna, Rio Grande e no próprio Estuário do Prata, com a Colônia de Sacramento.

O início da povoação da região de Jaguarão descende justamente desse contexto. Às margens do Rio Jaguarão, no local conhecido como Cerro da Pólvora (hoje dentro da área urbana da cidade) foi estabelecida inicialmente uma guarnição militar espanhola, mais tarde tomada pelos portugueses, no entorno da qual se desenvolveu a povoação do Espírito Santo do Cerrito de Jaguarão.

Ao longo de sua história a cidade foi palco de disputas e batalhas entre as duas coroas e, mais tarde, após a independência e quando as fronteiras já estavam relativamente bem definidas, entre a elite pecuarista regional e o Governo Central. Portanto, a cidade cresceu envolta em uma atmosfera militar, e apesar de as fortificações originais não existirem mais, outros elementos marcam essa presença, como as ruínas da antiga Enfermaria Militar e um novo quartel do exército, construído já no século XX.

Ainda hoje situada na fronteira, a povoação se formou e desenvolveu voltada para o Uruguai, apesar de separada pelo Rio Jaguarão, que nesse trecho delimita a divisão entre os dois países. A despeito das disputas políticas, a população sempre transitou entre os dois lados de maneira irrestrita, e o comércio de fronteira – em grande parte informal e estabelecido nos laços de parentesco entre os habitantes e nas propriedades rurais que os pecuaristas mantinham nos dois lados da fronteira – garantia a manutenção dos laços culturais que as longínquas coroas tentavam separar politicamente.

A Ponte Internacional Mauá, financiada pelo Uruguai em decorrência de uma dívida de guerra com o Brasil e executada no início do século XX por uma firma carioca, veio unir fisicamente o que já era indissociável culturalmente. E como em outros pontos da fronteira entre o Rio Grande do Sul e o Uruguai, Jaguarão e Rio Branco estabeleceram definitivamente sua interdependência, que se estendia a toda a região sul do Brasil e ao Uruguai com a implantação da linha férrea que conectou a malha gaúcha ao porto de Montevidéu. Por ela eram transportados os produtos oriundos da pecuária, principal atividade econômica da região.

Assim, a construção da ponte representa ainda a resistência das elites pecuaristas gaúchas, em constante disputa inicialmente com a coroa portuguesa e, mais tarde, com a administração centralizada no Rio de Janeiro e dominada pelos cafeicultores. A pecuária (principal produto da região até os dias de hoje), juntamente com o processamento da carne de gado para a produção de charque, permitiu o estabelecimento de uma classe social economicamente fortalecida no sul do país, mas cujos interesses muitas vezes eram preteridos pelo Governo Central, em favorecimento de interesses econômicos mais bem representados como a cafeicultura. A tensão entre os pecuaristas no sul e o governo acabou chegou a deflagrar conflitos armados, como as revoluções Farroupilha e Federalista, até hoje de grande importância para a cultura gaúcha.

O Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural
O Conselho que avalia os processos de tombamento e registro de bens do patrimônio cultural brasileiro, presidido pelo presidente do Iphan, Luiz Fernando de Almeida, é formado por especialistas de diversas áreas, como cultura, turismo, arquitetura e arqueologia. Ao todo, são 22 conselheiros de instituições como Ministério do Turismo, Instituto dos Arquitetos do Brasil, Sociedade de Arqueologia Brasileira, Ministério da Educação, Sociedade Brasileira de Antropologia
e Instituto Brasileiro de Museus – Ibram e da sociedade civil.

Mais informações
Assessoria de Comunicação Iphan
comunicacao@iphan.gov.br
Adélia Soares – adelia.soares@iphan.gov.br
Daniel Hora – daniel.hora@iphan.gov.br
 (61) 2024-6187 / 2024-6194
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