Iphan avalia registro de festa em Pirenópolis, em Goiás, como patrimônio cultural brasileiro

publicada em 13 de abril de 2010, às 15h22

 

Reunindo fé e tradição, celebração do Divino Espírito Santo mobiliza a cidade goiana durante o ano, recriando as festas de santos trazidas pelo colonizador português

O sagrado e o profano; a realeza e o popular; a diversidade e a singularidade. Anos e anos de fé e dedicação fizeram da Festa do Divino Espírito Santo em Pirenópolis, estado de Goiás, a mais rica expressão da religiosidade popular cristã da cidade, onde os moradores se preparam durante um ano inteiro para festejar e participar da histórica celebração. Todos os rituais da festa serão apresentados ao Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural, que estará reunido no dia 15 de abril no Rio de Janeiro, com a proposta do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) para registrar a Festa do Divino Espírito Santo de Pirenópolis como patrimônio cultural nacional. Depois do Círio de Nossa Senhora de Nazaré, em Belém do Pará, em outubro de 2005, a Festa do Divino Espírito Santo de Pirenópolis é a primeira manifestação religiosa encaminhada à análise do Conselho Consultivo para registro como Patrimônio Cultural Brasileiro, com inscrição no Livro das Celebrações. 

As festas de santos, trazidas pelos colonizadores europeus como devoção religiosa e como expressão da cultura popular e medieval, se espalharam pelo Brasil, durante o processo de colonização e ocupação do território, sendo mescladas aos cultos de matriz africana e às crenças religiosas indígenas. Entre as que se destacam, como as festas juninas e as de Nossa Senhora do Rosário, estão as do Divino Espírito Santo, popularizadas por todo o Brasil, a partir do século XVII, por jesuítas e colonos açorianos. O culto ao Divino Espírito Santo está relacionado às comemorações do fim do ciclo agrícola, época festiva da colheita de cereais, e remete à celebração judaica de Pentecostes, quando se ofertavam os primeiros frutos da colheita ao Espírito Santo. No dogma católico, o Espírito Santo integra a Santíssima Trindade, ao lado de Deus Pai e de seu Filho Jesus, e se manifesta como uma pomba branca ou como línguas de fogo.

Desde sua origem em Portugal, a celebração ao Espírito Santo destaca a figura do imperador, com sua coroa de prata, cetro e bandeira do Divino. Ele é o responsável pela realização da festa, escolhido por sorteio entre os homens ou meninos do povo. A população local oferece pães, grãos e animais para os festejos, que geralmente envolvem grandes refeições coletivas. Grupos de músicos saem pelas ruas em folias, recolhendo donativos, levando estandartes vermelhos como o fogo do Espírito Santo. Nas procissões, crianças vestem-se de anjo, o imperador segue em cortejo pela cidade conduzido por virgens vestidas de branco. Uma burlesca mascarada sai pelas ruas. Um imenso mastro com a bandeira do Divino é erguido no pátio principal da cidade, onde fogos de artifícios encerram a festa. 

Os festejos em Pirenópolis
A Festa do Divino de Pirenópolis é realizada anualmente desde 1819, data do primeiro registro na lista local de imperadores. Desde então, ano após ano, essa listagem é atualizada e publicada na programação da festa. É considerada uma das mais expressivas celebrações do Espírito Santo no país, especialmente pelo grande número de seus rituais, personagens e componentes, como as cavalhadas de mouros e cristãos e os mascarados montados a cavalo. Enraizada no cotidiano dos moradores de Pirenópolis, a Festa do Divino determina os padrões de sociabilidade local, consolidando-se como elemento fundamental da identidade cultural da cidade.

Os rituais têm início no domingo de Páscoa e seguem até o domingo seguinte ao feriado de Corpus Christi. O clímax da festa é no Domingo de Pentecostes ou do Divino. Os elementos essenciais incluem as Folias da Roça e da Rua, a coroa, as cerimônias e rituais do Império, com alvoradas, cortejos do Imperador, novena, jantares, cafés, missas cantadas, levantamento do mastro, queima de fogos, distribuição de “verônicas”, sorteio e coroação do novo Imperador.

Já as Cavalhadas encenam batalhas medievais entre mouros e cristãos – em honra do Imperador e do Espírito Santo. Elas começam no domingo de Pentecostes e vão até terça-feira à noite, quando rezam ao Divino e descarregam as armas, encerrando o Império. A festa é aberta no sábado pelos Mascarados – onças, capetas, caveiras, bois com grandes chifres e monstros – que ao meio-dia anunciam a abertura da festa na véspera de Pentecostes. Eles circulam pela cidade e no Campo das Cavalhadas, no intervalo das encenações. 

Outras expressões e rituais agregados à Festa são o Reinado de Nossa Senhora do Rosário e de São Benedito, a encenação de dramas e operetas, do auto natalino As Pastorinhas, os ranchões dançantes e a feira livre. A Cavalhadinha é uma celebração realizada por crianças de até 12 anos e reproduz todos os rituais da festa, menos as folias. Assim, brincando, as novas gerações aprendem os valores e referências da identidade cultural dos pirenopolinos, garantindo a continuidade da Festa do Divino.

Medidas de Salvaguarda
A pesquisa realizada pelo Departamento de Patrimônio Imaterial do Iphan constatou que a Festa do Divino Espírito Santo de Pirenópolis apresenta todos os pressupostos que permitem entendê-la como um “fato social total”. É um sistema de produção e circulação de bens e de dádivas baseados na reciprocidade, interferindo em todas as dimensões da vida social local. A própria comunidade descreve a festa como “patrimônio de valor inestimável” e investe na manutenção da tradição. 

No entanto, o Iphan detectou o risco de alguns problemas pontuais, como a possibilidade do impacto negativo com a utilização da Festa apenas como atrativo turístico. Desta forma, as medidas de salvaguarda visam enfrentar os problemas que possam ameaçar a manifestação cultural. 

O Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural
A reunião do Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural será no próximo dia 15 de abril, às 14h, no Salão Portinari, que fica no Palácio Gustavo Capanema, sede do Iphan no Rio de Janeiro. Nesta data, além do registro da Festa do Divino de Pirenópolis, está na pauta, também, o tombamento do centro histórico de Serra do Navio, no Amapá. 

O Conselho que avalia os processos de tombamento e registro, presidido por Luiz Fernando de Almeida, presidente do Iphan, é formado por especialistas de diversas áreas, como cultura, turismo, arquitetura e arqueologia. Ao todo, são 22 conselheiros de instituições como Ministério do Turismo, Instituto dos Arquitetos do Brasil, Sociedade de Arqueologia Brasileira – SAB, Ministério da Educação, Sociedade Brasileira de Antropologia e Instituto Brasileiro de Museus – Ibram e da sociedade civil.

Mais informações:
Assessoria de Comunicação Iphan 
Adélia Soares – adelia.soares@iphan.gov.br
(61) 2024-5449
www.iphan.gov.br

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