Nota de esclarecimento sobre Coletivos Deliberativos de Capoeira

Na última semana, uma postagem de Vitor Narciso Gavião-RS afirmou ter sido “descoberto o motivo do Iphan criar Conselhos de Mestre” na Capoeira. Segundo a nota, seria para “repassar verba aos amigos do rei”.

A afirmação é superficial e sem qualquer base fática, pelo que vale explicitar:

•       os parâmetros da política de salvaguarda do patrimônio cultural imaterial, adotada há 15 anos pelo Iphan e amplamente reconhecida no Brasil e no ambiente internacional, foram estabelecidos pelo Decreto 3551, editado no ano 2000;

•       ao contrário do que diz a postagem, o Iphan não “cria Conselhos”, mas submete o Registro de bens imateriais ao Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural, criado há quase 80 anos, em 1937, ou seja um dos mais estáveis e tradicionais do país;

•       o Iphan também não trabalha visando grupos restritos, mas aporta recursos de apoio à salvaguarda de bens registrados apenas por seleções públicas por meio de Editais, baseados em critérios claros e consistentes;
 
•        toda ação do Iphan visando à salvaguarda de bens registrados tem por princípio não “eleger” nem interferir em estratégias de organização internas aos grupos e comunidades que estão à frente dos bens reconhecidos, aos quais se convencionou denominar “detentores”. Para tanto, o Iphan leva em consideração a complexidade singular de cada bem e, a partir da experiência acumulada, aceita que a formação dos coletivos deliberativos dos detentores seja flexível, desde algumas características básicas sejam preservadas. Essas representações podem assumir formatos diversos tais como Grupos de Trabalho, Fóruns, Conselhos, Comitês ou outros tipos de organização exclusivamente, sempre a partir do consenso entre os detentores;

•       tais “grupos de trabalhos” ou “comitês” representam os desejos e necessidades dos grupos, mas não fazem gestão de recursos financeiros e tampouco têm personalidade jurídica, assim como seus participantes não são remunerados;

•       o funcionamento e a dinâmica interna de cada coletivo dependerão da forma de articulação dos participantes e da definição de papeis de cada uma das instâncias. Aspectos como a existência ou não de subdivisões internas, a periodicidade das reuniões e encontros e os critérios acerca da inserção ou saída de integrantes podem ser variados, mas são requisitos básicos, somados às características já mencionadas, para formação de um coletivo de gestão da salvaguarda.

Nesse sentido, o Iphan constrói uma política participativa, cujo protagonismo está nos atores sociais diretamente envolvidos na produção e reprodução do bem cultural em questão (detentores) e nas instituições parceiras. Trata-se de política reconhecida como modelar e referencial justamente por estar orientada para aumentar a participação democrática dos detentores na formulação, no planejamento, na execução e no acompanhamento de políticas de preservação do patrimônio cultural e, com isso, promover a sustentabilidade cultural dos Patrimônios Culturais do Brasil.

A avaliação do Instituto, amplamente corroborada pelos detentores, é de que comitês e outras formas de organização regional, ao contrário do que o texto busca afirmar, têm se mostrado uma estratégia acertada para oferecer ao Iphan os parâmetros de salvaguarda de um bem tão dinâmico, complexo, diversificado e regionalmente amplo como as práticas que envolvem os Mestres e a Roda de Capoeira.
 

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