Sons de memórias: uma biblioteca sonora do sertão
Quem acredita que apenas de palavras se dá a comunicação no Nordeste brasileiro está muito enganado. O Sonário do Sertão, uma das ganhadoras da 31ª Edição do Prêmio Rodrigo Melo Franco de Andrade, do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), é um registro sonoro da cultura sertaneja, no qual o acervo dos sons das comunidades acaba retratando seu Patrimônio Cultural. O inventário preserva o patrimônio imaterial do sertão de Pernambuco e Bahia.
Dentro do projeto Movimento dos Pequenos Agricultores (organização sem fins lucrativos, de caráter nacional e popular, que faz parte da articulação internacional de movimentos camponeses), em parceria com a Universidade de Brasília (UnB), oficinas de audiovisual foram realizadas nas comunidades sertanejas de Várzea Nova e Várzea Queimada, na Bahia, e Bodocó, em Pernambuco. A partir dessas atividades, foram identificadas variadas atividades culturais e artísticas que nunca haviam sido registradas em meios audiovisuais. Os diálogos com as lideranças, anciãos e anciãs e com a jovens também apontavam para a necessidade de preservação do Patrimônio Cultural dessas comunidades.
Os sons do cotidiano
Com um processo participativo, em 2015, o Sonário do Sertão começou a ser desenvolvido. Foram realizadas oficinas de capacitação técnica para os registros de áudio, levantamento do que seria registrado, debates e formação sobre a cultura do ouvir e a prática da escuta. O Sonário conta com registro de sons do cotidiano do semiárido brasileiro, como canto dos pássaros, som de carroças em movimento, do entardecer, de galinheiro, assim como grupos musicais, cantigas, orações, os cantos de trabalho e melodias assoviadas durante a plantação da mandioca e festas religiosas. As histórias narradas pelas anciãs e anciãos foram também registradas e, nessas conversas, os cantos e diversos sons participam no meio das narrativas, onde o contar e o cantar tornam-se uma coisa só.
O resultado do projeto foi o levantamento de mais de mil registros sonoros que, aos poucos, vêm sendo classificados e indexados. O acervo no site do projeto já conta com mais de cem faixas sonoras.
Todos os equipamentos utilizados no Sonário do Sertão permaneceram nas comunidades. Com as oficinas, mais de 50 jovens foram formados em atividades de captação de áudio, escuta atenta, pesquisa, identificação e levantamento do acervo, valorizando a participação da comunidade na construção de sua própria memória sonora.
31ª Prêmio Rodrigo Melo Franco de Andrade
Instituído pelo Iphan em 1987, o Prêmio Rodrigo Melo Franco de Andrade tem como objetivo o reconhecimento a ações de proteção, preservação e divulgação do Patrimônio Cultural Brasileiro e é uma homenagem ao primeiro dirigente da Instituição. A participação foi aberta a empresas, instituições e pessoas de todo o país. Depois passarem pelas comissões estaduais – compostas por representantes das diferentes áreas culturais, presididas pelo superintendente de cada estado – as 94 ações selecionadas em 25 Estados e no Distrito Federal passaram pela Comissão Nacional de Avaliação.
Em consonância com a proposta do Iphan de levar a cerimônia de premiação para todas as regiões do Brasil, a festa, este ano, será em Belém, capital do Pará. A escolha da cidade se deu em razão de, em 2018, o Instituto estar voltado para a promoção do Patrimônio Cultural do Norte brasileiro. Marcada para novembro, a celebração do Prêmio Rodrigo Melo Franco de Andrade será em ritmo de carimbó, bem registrado pelo Iphan como Patrimônio Cultural do Brasil, e contará com apresentações de outras expressões tradicionais do Norte, como o Boi-Bumbá de Parintins.
O advogado, jornalista e escritor Rodrigo Melo Franco de Andrade nasceu em 17 de agosto de 1898, em Belo Horizonte. Foi redator-chefe e diretor da Revista do Brasil e, na política, foi chefe de gabinete de Francisco Campos, atuando na equipe que integrou o Ministério da Educação e Saúde do governo Getúlio Vargas. O grupo era formado por intelectuais e artistas herdeiros dos ideais da Semana de 1922. Rodrigo Melo Franco de Andrade comandou o Iphan desde sua fundação, em 1937, até 1967.
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