Concurso Sílvio Romero - Edição 2003

Ao todo, 31 monografias foram recebidas na edição 2003 do Concurso Sílvio Romero. Como previa o edital, dois trabalhos foram premiados e três receberam menções honrosas.

1º prêmio: Rosilene Alves de Melo (Universidade Federal do Ceará) - Arcanos do verso: trajetórias da Tipografia São Francisco, em Juazeiro do Norte, 1926-1982

Esse trabalho teve como objetivo investigar o percurso da Tipografia São Francisco em Juazeiro do Norte, no período entre 1926 e 1982. Recorrendo a engenhosas estratégias bem sucedidas na produção e distribuição de seus impressos, a Tipografia São Francisco ocupou uma posição privilegiada no acirrado mercado de folhetos de cordel e transformou-se na mais importante editora do gênero no país. A produção e a distribuição destes livros envolvem a presença da memória, da oralidade, do corpo, da iconografia e de máquinas. Através da leitura do acervo colocado em circulação pela Tipografia São Francisco, é possível perceber como se relacionam a dimensão criativa da fabulação poética e a organização de uma próspera corporação editorial, cuja história se confundiu com a trajetória de seu proprietário, o poeta José Bernardo da Silva. Neste sentido, são analisadas as condições que historicamente conferiram maior visibilidade à literatura de folhetos em Juazeiro e contribuíram para fortalecer a presença desta atividade editorial na complexa trama de linguagens e objetos que transitam na cidade.

2º prêmio: Frederico Augusto Garcia Fernandes (Universidade Estadual Paulista) - A voz e o sentido: a poesia oral pantaneira

Essa tese compreende um estudo da poesia oral pantaneira no momento de sua atualização, ou seja, durante a performance. Para tanto, ela se divide em três partes principais. Na primeira, com base em relatos de viagem, foram identificados embates discursivos entre o narrador e o viajante. A partir desses embates, foi demonstrado como, durante a performance, a presença do auditório exige do narrador uma postura frente àquilo que conta, ou seja, como ele cria uma identidade, que se manifesta pelo discurso da narrativa. Outro ponto discutido diz respeito ao registro da poesia oral pelo viajante, em que enfatizei como elementos ligados à performance foram ignorados e como a transcrição interfere na compreensão do texto oral. Na segunda parte, foram analisados os aspectos discursivos da narrativa oral. Constatei que o narrador cria uma "autoridade" (relação frente ao auditório) e "autoria" (atualização do texto que ouviu), pelas quais ele engendra um discurso identitário. A questão das variáveis e invariantes no texto oral foi estudada na terceira parte. Assim, detive-me no estudo das narrativas de enterro pantaneiras. Identifiquei elementos invariantes (origem, anunciação, marcação, provação, desenlace), que congregam algumas variáveis (tipos de origem, formas diferenciadas de anunciação, etc.). Além disso, as narrativas se reorganizam mudando de significado, como constatei com o protoconto, a explicativa, o logro e a descritiva. O último capítulo tratou da performance, em que foi analisada a manifestação da narrativa na performance e, também, alguns dos mecanismos que o narrador emprega para persuadir o seu auditório. Os estudos assim divididos visam a dar uma visão sincrônica da poesia oral, pois partem do texto oral em seu espaço de constituição, levando em conta a voz (identidade e ruído) do narrador.

1ª menção honrosa: Wagner Neves Diniz Chaves (Universidade Federal do Rio de Janeiro) - A folia em jornada: uma etnografia da Folia de Reis do Mestre Tachico

2ª menção honrosa: Luciana Hartmann (Universidade Federal de Santa Catarina) - Gestos, memórias e histórias dos contadores e contadoras de “causos” gaúchos

Na Campanha do Rio Grande do Sul - fronteira com Argentina e Uruguai - há uma forte tradição oral que é recriada e transmitida cotidianamente. Nestas ocasiões, nestes "eventos narrativos", contadores e contadoras de causos incorporam e reproduzem, na sua ação de contar, aspectos da memória do grupo. A pesquisa nesta região demonstrou que esta memória desenvolve-se a partir de diferentes relações: com o meio ambiente (o pampa), com a história local (marcada por inúmeros conflitos armados), com o trabalho cotidiano (calcado na lida campeira) e com os países vizinhos (de colonização e língua espanhola) e manifesta-se não apenas no imaginário da população - suas narrativas - mas também através do corpo e da voz destes contadores, através de suas performances. O conceito de performance, neste sentido, dá conta de todo o universo que envolve as narrações orais, desde as ações físicas e vocais dos contadores até a rede de relações estabelecidas com o público (os ouvintes - sua comunidade narrativa) e com o meio que os cerca.

3ª menção honrosa: Renata de Sá Gonçalves (Universidade Federal do Rio de Janeiro) - Os ranchos pedem passagem. O carnaval no Rio de Janeiro no começo do século XX

Partindo de análise dos ranchos carnavalescos, ditos precursores das escolas de samba, esta dissertação tem como foco um conjunto de relações sociais que revela uma ideia do Rio de Janeiro e de suas sociabilidades no começo do século XX. Propomos construir, assim, uma compreensão sociológica da relação entre essa forma carnavalesca e a cidade. A articulação entre níveis e expressões culturais “letradas” e “musicais”, “populares” e “eruditas”, “tradicionais” e “modernas”, antes de indicar oposições, aponta para a complementaridade social. Revelam conexões entre atores sociais diversos, processos temporais distintos, níveis de expressão artística e cultural e (trans) formação da cidade.

Comissão julgadora:
Antônio Carlos de Souza Lima, doutor em Antropologia, professor adjunto do Museu Nacional/UFRJ; Edgar Leite Ferreira Neto, doutor em História, professor da Pontifícia Universidade Católica-RJ; Maria Claurênia de Andrade Abreu Silveira, doutora em Letras, professora da  Universidade Federal da Paraíba; Rita Laura Segato, doutora em Antropologia, professora da  Universidade de Brasília; Guacira Waldeck, mestre em Ciências Sociais (Antropologia) pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, representante do Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular/Iphan.

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